Você já se perguntou qual o partido político do Bitcoin? Direita ou esquerda, capitalista ou socialista, conservador ou progressista, muitas pessoas tendem a classificar absolutamente tudo em categorias ideológicas. Esse fenômeno é ainda mais evidente com a polarização e a politização de diversos assuntos que, até alguns anos atrás, não estariam relacionados à política.

Não é surpreendente que haja tanta insatisfação com a politização excessiva de tudo. De fato, esse rótulo político também é aplicado ao bitcoin.

Esquerda e direita buscam resolver os mesmos problemas, mas por caminhos opostos.

A esquerda tende a defender mais impostos e mais liberdades sociais para enfrentar esses problemas, enquanto a direita tende a apoiar menos impostos e maior liberdade individual. Assim, muitas pessoas acreditam que o Bitcoin é associado à direita, porém essa afirmação é o equivalente a dizer que usar o computador é coisa de direita, ou coisa de “bolsominion”.

No entanto, a realidade é que, dependendo do ponto de vista, o Bitcoin pode ser visto como bipartidário, podendo ser associado tanto à esquerda quanto à direita. Neste artigo, você entenderá com qual espectro político o Bitcoin se relaciona.

Bitcoin é de direita?

O Bitcoin pode ser considerado como uma ideia de direita, pois favorece a liberdade individual. Ninguém pode confiscar ou impor restrições ao seu Bitcoin, mesmo que um grande grupo de pessoas tente.

O Bitcoin é uma propriedade privada única, não podendo ser tomado à força através de confisco ou censura, uma vez que não requer nenhum intermediário para custodiar ou conceder o direito de possuí-lo. Você simplesmente o tem, sem depender de ninguém além de si mesmo.

O Bitcoin e a Redução do Controle Estatal

Muitos libertários e ancaps (anarcocapitalistas) se identificaram inicialmente com a ideia do Bitcoin, pois ele é um protocolo que separa o dinheiro do controle estatal e reduz a influência dos governos nas decisões sobre a moeda.

A história do dinheiro está repleta de exemplos de roubo e ataques à propriedade privada. Desde a Roma antiga, governos diluíam o poder da moeda misturando outros metais menos valiosos e reduzindo a proporção de ouro, levando a ciclos de colapso e destruição de riqueza de toda a população devido ao excesso de intervencionismo governamental.

Por esse motivo, a direita foi a primeira a enxergar o Bitcoin como uma ferramenta para preservar seus valores e devolver o direito de propriedade a cada indivíduo. Governos autoritários também se valem da narrativa do coletivo para cometer atrocidades contra minorias, o que ocorreu inúmeras vezes na história.

A direita tende a ver a economia como um incentivo para o desenvolvimento e evolução da sociedade, com a liberdade econômica como pilar. É por isso que o Bitcoin se alinha aos princípios da direita, pois ninguém pode modificar as sólidas propriedades econômicas do Bitcoin, como o limite de 21 milhões de unidades, o cronograma de halvings e o ajuste de dificuldade que mantém a rede estável.

Uma ferramenta apolítica para o consenso

Em outras palavras, como nenhum político pode se beneficiar pessoalmente ao usar a narrativa do coletivo acima do indivíduo para modificar o Bitcoin, ele se torna uma ferramenta a serviço dos princípios de liberdade individual e não de entidades centralizadoras que poderiam manipular o código para fins demagógicos.

Mas, o mais incrível é que isso não se opõe aos princípios da esquerda. O Bitcoin também serve aos ideais progressistas, uma afirmação que será totalmente negada por aqueles que se identificam com a direita.

Bitcoin é progressista (de esquerda)?

Geralmente, os valores que norteiam a esquerda estão fundamentados em colocar as necessidades das pessoas comuns acima dos interesses corporativos ou da minoria mais rica, conhecida como os “1%”, que concentram a maior parte da riqueza. Essa desigualdade de riqueza é um alvo frequente de críticas e é o cerne da famosa luta de classes.

Um dos principais objetivos da esquerda é facilitar a distribuição de riqueza para combater a desigualdade, a pobreza e promover maior equidade no mundo. No entanto, muitas pessoas de esquerda estão começando a perceber que as injustiças econômicas atuais são consequências de políticas monetárias injustas, que favorecem o enriquecimento dos mais ricos em detrimento da maioria. Esse fenômeno é conhecido como “efeito Cantillon”.

O que é efeito cantillon?

O Efeito Cantillon é uma teoria econômica que descreve como o aumento da oferta monetária beneficia os primeiros beneficiados (geralmente bancos e grandes empresas), enquanto prejudica os grupos que recebem o dinheiro mais tarde, resultando em desigualdades econômicas.

A percepção da esquerda sobre a concentração de poder

A esquerda está percebendo que as grandes corporações concentram poder e riqueza devido à própria natureza do dinheiro e à forma como o governo o administra, o que acaba alimentando a causa central da sua luta: a diferença de classes.

Bitcoin como alternativa descentralizada

Embora a esquerda geralmente apoie soluções centralizadas no governo, especialmente no âmbito financeiro, é justamente o próprio governo e a corrupção humana que acabam direcionando a distribuição do dinheiro para as mãos de poucos. Nesse contexto, o Bitcoin surge como uma alternativa intencionalmente projetada para resistir ao controle de qualquer entidade, seja corporações gananciosas ou um governo autoritário ou ditatorial.

Um exemplo marcante disso foi o período da pandemia, quando a maior parte do dinheiro impresso não foi direcionado para salvar empregos ou beneficiar cidadãos comuns, mas sim para socorrer o mercado de ações e outros interesses dos detentores de ativos. Os bancos cresceram significativamente e as bolsas de valores registraram altas, pois o dinheiro foi destinado a essas entidades.

Nesse processo, o poder de compra dos salários das pessoas colapsou, afetando principalmente os mais pobres.

Os preços de produtos básicos aumentaram consideravelmente, e os ativos que poderiam compensar a inflação monetária tornaram-se cada vez mais inalcançáveis para quem ganha um salário mínimo, por exemplo. O poder de compra foi significativamente reduzido, como podemos lembrar dos altos preços do arroz e do óleo de cozinha que foram destaque nas notícias durante 2020 e 2021.

Para a esquerda, o Bitcoin pode ser encarado como uma ferramenta capaz de viabilizar a tão almejada redistribuição de riqueza. Ele rompe com a engrenagem que facilita a criação de um cartel por corporações, bancos e governos, os quais retiram valor das pessoas e o entregam nas mãos das grandes instituições financeiras. Essas instituições são frequentemente salvas quando enfrentam problemas financeiros, às custas dos mais pobres que ficam à margem desse mecanismo.

Se as pessoas adotarem o Bitcoin, sua valorização tende a acabar com o efeito Cantillon e a concentração de poder nas mãos daqueles que estão mais próximos das impressoras de dinheiro dos governos: os bancos e corporações tão criticados pela esquerda.

Neutralidade, acessibilidade e descentralização

Além disso, o Bitcoin é neutro em relação à raça, religião, etnia, gênero, ou qualquer outro fator discriminatório. Ele processa transações de qualquer pessoa para qualquer outra pessoa, independentemente de qualquer outro aspecto. A única exceção é se alguém não seguir as regras da rede, que são definidas matematicamente como uma linguagem universal.

Outro aspecto importante é que o Bitcoin opera por meio de milhares de computadores independentes, sem a centralização por parte de grandes corporações. Cada pessoa que utiliza o Bitcoin é como um nó independente que funciona seguindo regras que incentivam a colaboração com o coletivo de nós. Dessa forma, o poder está nas mãos das pessoas e não nas dos grandes bancos.

Assim, para a esquerda, o Bitcoin representa uma alternativa descentralizada e neutra, com potencial para desafiar a concentração de poder econômico e promover maior equidade financeira, ao mesmo tempo em que favorece uma maior inclusão e independência financeira para todos os indivíduos, independentemente de suas origens ou características pessoais.

O Bitcoin também se destaca por ser incrivelmente acessível. Não há um investimento mínimo para adquirir bitcoin, e você pode armazenar a quantidade que desejar, não sendo necessário possuir uma conta bancária para comprá-lo. É possível adquirir bitcoin em lotéricas, pagando em dinheiro, sem a necessidade de uma conta bancária.

Bitcoin como uma ferramenta de resistência

O Bitcoin é uma rede que protege os interesses individuais, e sua segurança está baseada no coletivo de nós que protegem todos os participantes da rede contra centralização, monopólio e quebra das propriedades econômicas fundamentais. Isso torna o bitcoin também uma solução tecnológica para muitos problemas sociais, embora não seja uma solução para todos eles.

Existe um consenso em torno de um conjunto de regras que afetam o aspecto social e beneficiam o todo. Afinal, nenhum governo, banco ou coletivo, seja de direita ou esquerda, conseguiu implementar uma moeda que não deprecie o poder de compra das pessoas ao longo do tempo.

O Bitcoin abraça a ideia de que toda pessoa tem voz e que o bitcoin não pode ser simplesmente retirado de alguém sem o consentimento dessa pessoa.

Solução de direita ou esquerda?

Por um lado, o Bitcoin é considerado uma solução de direita, pois separa o dinheiro do controle estatal, proporciona mais liberdade ao indivíduo e é uma propriedade inconfiscável.

Por outro lado, ele também atende aos objetivos progressistas da esquerda, pois busca acabar com a concentração de poder nas mãos de poucos e contribui para a construção de comunidades mais fortes. Mesmo ditaduras não conseguem controlar o bitcoin, tornando-se uma ferramenta de resistência para muitas minorias.

Notícia de como o Bitcoin alimentou os maiores protestos nigerianos

Abaixo, veja como, na África, um grupo de feministas começou a ser censurado e oprimido pelo governo local, mas elas conseguiram continuar protestando, recebendo doações através de bitcoin.

Notícia sobre como o Bitcoin é uma linha de vida para refugiados Africanos

Veja também como mulheres que foram proibidas de estudar e trabalhar no Afeganistão, devido às ofensivas do Talibã, conseguiram se manter estudando e trabalhando graças ao bitcoin.

Mulheres Afegãs usam Bitcoin para fugir do Afeganistão

Inclusive, várias pessoas de esquerda estão começando a criar conteúdos sobre isso, abordando como o bitcoin também é uma ferramenta útil à esquerda. Um exemplo é o livro “The Progressive Case for Bitcoin“, onde o autor explora muitos desses pontos.

No fim das contas, o bitcoin é uma ferramenta que garante direitos humanos em vários níveis, e isso comprova, na verdade, um terceiro ponto importante.

Bitcoin é bipartidário?

Bitcoin é bipartidário, serve a qualquer lado porque ele está acima da politica, ele é uma ferramenta que qualquer pessoa pode usar. Enquanto esquerda e direita dividem princípios indissociáveis, bitcoin unifica todos eles porque serve ao todo, sem restrições.

É por isso que Bitcoin também é apolítico, pois ele oferece soluções fora do alcance da política convencional. Ao trazer consenso, em vez de polarização, o Bitcoin não possui hierarquia que possa ser corrompida para alterar suas regras. Assim, ele protege a todos, incluindo maiorias e minorias, ao retirar a política das decisões monetárias.

Além disso, ele despolitiza a economia, removendo os caprichos tanto da esquerda quanto da direita, que historicamente têm manipulado o dinheiro através dos governos. Ele é independente do espectro político e não serve aos interesses de nenhuma ideologia específica.

O melhor é que, com o Bitcoin, não é necessário escolher lados políticos, pois ele não é influenciado pelas mudanças de governo ou pelos interesses de políticos. Suas regras são imutáveis, e a solução está, de fato, fora da política, o que o torna independente dela.

Até a próxima e opt out.

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Carol Souza

Carol é uma das principais educadoras de Bitcoin no Brasil. Ela participou de seminários para desenvolvedores de Bitcoin e Lightning da Chaincode (NY) e é palestrante em conferências sobre Bitcoin ao redor do mundo.

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